A mudança em linguagem fotográfica

A bela representação do devir.
[MUDAM-SE OS TEMPOS…]
Luís de Camões

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve), as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E, enfim, converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.

* * * * * * *
Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sem­pre iguais, ainda não foram terminadas — mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desa­finam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou.” — a beleza que emana desse fragmento es­crito por Guimarães Rosa (do livro Grande sertão: veredas) não corresponde à reflexão leve­mente melancólica, porém sóbria, do soneto de Camões. Para o grande poeta português, embora tudo mude incorporando “novas qualidades”, tem o Homem, seguindo o raciocínio exposto, a consciência de que todas as novidades sejam diferentes — e talvez infelizmente — do esperado/ desejado (versos cinco e seis), por já ter vivido muitas experiências tristemente marcantes na memória (verso sete) e pouca (ou, talvez, nenhuma) sensação de prazer em alguns momentos (verso oito).
Essa reflexão lírica, logo, é realçada por estes pares que se opõem:  “mal” x “bem”, “verde manto” x “neve fria”, “choro” x “doce canto”. Aqui a mudança, refletindo-se na vontade humana (do poeta), é tão profunda e surpreendente, que nada muda como dantes mudava (versos treze e catorze); a oposição passado x futuro fica evidente, e ecoa alguns séculos depois neste verso de Fernando Pessoa: “E era sempre melhor o que passou.” (do poema “Natal”).
Portanto, lembra-nos Camões, tudo está sujeito a mudanças no tempo, causando, conse­quentemente, perplexidade em quem vive, e não encantamento — encantamento que se mani­festa, e belamente, nas palavras de Guimarães Rosa. Contudo a poesia — “doce canto” — foto­grafa essas transformações incessantes que, reveladas na consciência de mundo, provocam o Homem a buscar em lembranças e sonhos um sentido para a realidade que o cerca.

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