No silêncio vivo das antigas vozes

“E já não enfrentamos a morte, de sempre trazê-la conosco.”
Carlos Drummond de Andrade

… E os pássaros cantam o mel das melodias, e as flores perfuram o céu das almas, e as lágrimas fecundam a terra dos sonhos… E em nosso mundo há vozes que ainda perfuram o ar que respiramos; vozes que ainda se desenham — e silenciosamente!… — em nossa memória.
Não deve haver, contudo, desespero. Viver não é mais que um ensaiar para o sagrado do mistério, — o segredo da morte. E, mesmo assim, outros corpos surgirão, para sorrir e chorar, de estranhas sombras crepusculares; e viverão; e passarão…
E os pássaros…
Ainda que, neste momento, no silêncio vivo das antigas vozes?…
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COM OS MORTOS
Antero de Quental

Os que amei, onde estão? Idos, dispersos,
Arrastados no giro dos tufões,
Levados, como em sonho, entre visões,
Na fuga, no ruir dos universos…

E eu mesmo, com os pés também imersos
Na corrente e à mercê dos turbilhões,
Só vejo espuma lívida, em cachões,
E entre ela, aqui e ali, vultos submersos…

Mas se paro um momento, se consigo
Fechar os olhos, sinto-os a meu lado
De novo, esses que amei: vivem comigo,

Vejo-os, ouço-os e ouvem-me também.
Juntos no antigo amor, no amor sagrado,
Na comunhão ideal do eterno Bem.

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